terça-feira, junho 30, 2009

O Jardim


Assim que o sol raiava pela janela do seu quarto, ele saía, pacífico, para ir contemplar o Jardim. Percorria a grande velocidade o caminho que o separava do velho portão de ferro e quando lá chegava agarrava-se a ele, sonhador, ficando a olhar através das grades para aquela imensidão verde, salpicada de todas as cores, de flores, animada pelo chilrear melódico de todos os pássaros, de todas as formas, com todas as cores. Depois desse momento de pasmo, quase convertido em espasmo, iniciava a sua série de infrutíferas tentativas com o objectivo de transpor o portão. Tentava saltar por cima, mas era demasiado alto; tentava passar por baixo, mas havia apenas uns centímetros; lateralmente, o gradeamento prolongava-se até ao horizonte e, uma por uma, todas as hipóteses de transpor aquele portão iam sendo descartadas. Tentou tudo menos colocar a mão na chave e rodá-la, porque lhe parecia demasiado fácil. Um dia fê-lo, a porta cedeu e ele fechou os olhos, expectante. Deu um passo em frente e com a inspiração profunda abriu-os de novo. Assim ficou, paralisado, largos minutos, boquiaberto, fitando à sua frente tudo quanto desejara tanto tempo! Mas à sua frente via apenas uma velha sucata, cheia de tudo quanto é indesejável: velhas máquinas, aparelhos, carros, tudo num tom negro e absorto numa atmosfera de trevas. Incapaz de acreditar naquilo que via, voltou atrás, fechou o portão e olhou de novo atrás dele. Viu novamente o belo do Jardim dos seus sonhos, só que desta vez, pela primeira vez, podia ver o seu rosto mergulhado nele. Era um espelho! Girou sobre si próprio e viu-se finalmente no Jardim da sua vida, o harmonioso espaço de amor, o espaço ideal para estar, para ser. E viu mais tarde que não estava ali sozinho! Havia muitas outras pessoas que se olhavam e que lhe disseram, seguras, que aquele Jardim era Deus!

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